O desafio de lançar novas marcas no mercado e convencer potenciais compradores a experimentá-las é uma das grandes tarefas do marketing. Aprender sobre ciência cognitiva e suas aplicações no marketing pode ajudar você na construção de campanhas mais eficientes.

O tema é tratado no livro “Branding Between The Ears” de Sandeep Dayal. Nele, o autor buscar explicar como diversas dinâmicas dos nossos cérebros funcionam e como podemos moldar o marketing para trabalhar em função da ciência cognitiva.

Se a sua empresas está se esforçando e investindo muito na área de marketing, mas sem obter retorno, talvez o problema seja que os consumidores não estão conseguindo separar a sua marca das outras existentes no mercado.

Nós, os profissionais de marketing, estamos sempre pensando em quais canais devemos estar ou não. O cérebro do consumidor é O canal e você precisa ocupá-lo imediatamente.

Durante o livro, o autor também se propõe a derrubar mitos e meias-verdades estabelecidas no marketing. Vamos analisar alguns deles aqui no blog.

Conteúdos emocionais são melhores para promover uma marca?

Vídeos ou comerciais emocionantes, sim, são normalmente mais lembrados pelos consumidores. No entanto, as marcas por trás deles nem sempre são.

As pessoas se lembram mais de histórias que provoquem emoções, mas isso normalmente faz com que as pessoas desconsiderem todo o restante (quem está promovendo essa história?).

O envolvimento é tão grande que o nosso cérebro anula qualquer outra informação que não seja a história em si.

É possível que você lembre de um comercial emocionante, mas não consiga ter certeza sobre qual marca o fez. Nesses casos, costumamos atribuir ao líder de mercado.

E se você é uma marca tentando ganhar mercado, você acabou de desperdiçar investimentos. Por isso, é preciso haver um balanço entre o conteúdo emocional e a mensagem da marca.

Daniel Kahneman e os dois Sistemas do cérebro

Para entender a ciência cognitiva e como ela é importante para o marketing, é necessário entender os papéis dos dois Sistemas do nosso cérebro.

A operação desses foi descrita por Daniel Kahneman, vencedor do prêmio Nobel de Economia.

O Sistema 1 é o repositório de aprendizados do passado em relação à diversos eventos que vivemos. Ele forma sabedoria que nos diz o que funciona ou não para nossas vidas. Assim, passamos a tomar decisões sem demandar grande esforço.

Quando o Sistema 1 está trabalhando, você não precisa pensar ou gastar energia para executar a tarefa. Um exemplo seria dirigir ou dizer um não imediato para um convite de uma festa, afinal seu cérebro sabe que você não suporta aquele ambiente. O cérebro guardou e aprendeu com base nas suas experiências anteriores.

As pessoas tendem a associar o S1 a um comportamento irracional, quando, na realidade, ele é extremamente sábio. Ele aprende e te ajuda a tomar decisões mais rápidas.

O Sistema 2 tem função de reflexão e construção, ele é ativado diante de riscos, novas informações ou experiências.

Se ele achar que uma decisão do Sistema 1 é arriscada, ele entrará em ação. O S2 analisa situações não familiares, faz cálculos complexos, põe a prova princípios, mapeia prós e contras de uma decisão.

O uso do Sistema 2 é mais difícil, penoso, mas recomendado em diversas situações. No entanto, diferente do que se diz, ele não é puramente racional. O emocional também pesa nessa relação complexa de fatores ao se tomar uma decisão.

O Sistema 2 só é ativado quando necessário. O S2 forma a sabedoria que é acumulamos no S1.

Como utilizar os Sistemas ao lançar novas marcas e produtos

Como você já deve ter imaginado, os dois sistemas influenciam diretamente na forma que tomamos decisões sobre produtos ou marcas.

Experimentar novas marcas ou produtos passa diretamente pelo Sistema 2. É um risco. É uma decisão calculada pela razão ou pelas nossas emoções.

Deixar de consumir um produto de outra marca para experimentar um novo é um risco. Adquirir um tipo de produto que você nunca comprou também é um risco.

Vou gostar? O preço tá bom? As crianças vão reclamar? Será que funciona mesmo? Melhor deixar para o mês que vem, né?

Tudo isso envolve diretamente o Sistema 2. Se a experiência for exitosa, a tendência é que esse aprendizado se acumule e a compra desta marca passe a operar dentro do Sistema 1. Se não funcionar, também irá se tornar um aprendizado, mas na outra direção.

Em termos de comunicação, podemos construir marcas falando com as crenças existentes nas pessoas e explorar o melhor de cada sistema.

Por exemplo, Sistema 1: “se vc acredita em A, então, vc deve acreditar em B”. A sua marca aqui é B. A é uma crença existente nas pessoas.

Sistema 2: “o mundo mudou. Tá na hora de você mudar também. Se pensar bem, verá que é melhor”. Essa é uma mensagem típica para o S2.

O Sistema 1 é o da lealdade. O Sistema 2 é da experimentação para novas marcas, produtos, comportamentos ou ideias.

A Brand Story

As estratégias propostas pelo autor para construir ou trabalhar marcas estão divididas em 3 macro categorias: Brand Vibes, Brand Sense e Brand Resolve.

Brand Vibes descreve o laço que pode unir uma marca e seus potenciais consumidores. Está relacionado com a química e o sentimento do consumidor quando é exposto a marca.

Brand-Story-Branding-como-lançar-marcas

As estratégias para você desenvolver a sua Brand Vibes trabalham especialmente com o Sistema 1. Para isso, você precisa conhecer profundamente os problemas, os sentimentos e o dia a dia do consumidor. Só assim você será capaz de construir um estilo que irá se conectar verdadeiramente com as pessoas.

Segundo o livro, existem mais de 100 preferências cognitivas que os cérebros humanos compartilham. São vieses (cognitive bias) a serem explorados para construir a Brand Sense. Vejamos alguns exemplos:

Familiaridade. As pessoas tendem a se conectar mais facilmente com quem lhes é familiar. Associar um produto a uma dinâmica comum da vida do cliente é uma forma de tornar uma marca ou produto familiar.

Autenticidade. Esse viés é cada vez mais difícil de se construir. No mundo dominado pelo Instagram, é difícil separar o que é fake e o que é autêntico. Mas aqui a marca precisa ser capaz de gerar um sentimento de que fala a verdade, de que ela sim é autêntica. Um “case” famoso aqui é a comunicação do ex-presidente Jair Bolsonaro, que é considerado por seus seguidores uma pessoa “autêntica” ou “gente como a gente”, já que ele “fala como a gente”.

bolsonaro-autêntico

Facilidade. Aqui se trabalha com o Sistema 1, então escolhas mais simples, coisas mais simples, são preferidas pelas pessoas. Os pais que precisam comprar fraldas e vivem uma rotina difícil, querem facilidade nas suas escolhas. O conforto vem primeiro.

Viés do Expert. Seguir uma horda ou uma tendência é mais confortável para o S1. As pessoas tendem a seguir as opiniões dos especialistas, dos experts. O mercado de pasta de dente é um dos que explora bem esse viés. “Recomendados por 9 em cada 10 dentistas”.

Brand Sense – Proposta de valor para lançar novas marcas e produtos

Lembremos: diante de riscos, o nosso cérebro ativa o Sistema 2. Comprar uma nova marca ou produto é normalmente um risco ou fuga da nossa “sabedoria” já acumulada.

Para explorar o S2, devemos trabalhar com a apresentação de valor através de 4 estratégias:

1 Mostrando como a marca entrega mais valor do que concorrentes (valor relativo)
2 Reduzindo o risco de usar a marca (riscos)
3 Tornando a sua proposta crível com razões para acreditar (percepção)
4 Provendo contexto que faça os consumidores pensarem sobre os riscos e ganhos (credibilidade)

Vamos mergulhar um pouco mais em cada uma dessas estratégias.

1 Valor relativo
1.1 “No-brainer” Method
Você pode fazer isso através do confronto entre benefícios e custos. O valor de utilizar o produto é muito maior do que o custo. O valor deve crescer a ponto dos cálculos na cabeça do consumidor se tornarem desnecessários. O preço pode ser um elemento “no-brainer”. O Uber trabalhou com essa metodologia na entrada de mercado.

1.2 Pleasure Prediction Method
Faça os clientes imaginarem os benefícios de uma forma ainda mais vívida. Dê forma para o benefício real. É um recurso muito comum em propaganda de televisão.

2 Riscos
2.1 Flight-or-flight Method
O medo afasta as pessoas. O objetivo da marca aqui é reduzi-los. Transformar o medo incapacitante em preocupações a serem superadas. Você deve superar o risco para alcançar novos sonhos.

2.2 Flirting Training Method
Deixe as pessoas “flertarem” com a marca. O exemplo clássico aqui é o trial de qualquer plataforma de streaming hoje. Use por 7 dias e veja se vale a pena. Assim, você reduz o medo ou risco da decisão do consumidor.

streaming-trial

3 Percepção
3.1 The Evidence Method

Traga evidências para o consumidor. Faça ele encarar os “fatos”. Traga elementos que o dê segurança ou certeza sobre seus equívocos. Traga um atributo de produto desminta uma crença antiga. Em alguns mercados, é comum achar que se você não fizer X, você não terá sucesso. Se você for um novo produto nesse contexto, é sua tarefa desfazer essa crença.

3.2 Survey Method
Traga provas sociais e pesquisas que sejam capazes de mudar o jogo. Dê para as pessoas “razões para acreditar” na marca.

4 Credibilidade (mude o contexto / torne a escolha pela marca mais favorável)
4.1 Reframing Method
Aqui, o objetivo é sempre mudar o ângulo com que as pessoas olham para a marca ou produto. É o famoso: “colocado desta forma, faz sentido”. Não é apenas uma relógio, é uma obra de arte. Veja o exemplo das pulseiras Louis Vuitton para o Apple Watch.

pulseira_louis_vuitton_para_apple_watch

Por fim, existe a possibilidade de indecisão entre o Sistema 1 e Sistema 2. Para isso, o autor invoca o “Brand Resolve”, que é a busca pela felicidade.

O marketing precisa entrar em ação para resolver impasses. No mundo cognitivo, a motivação para comprar algo é uma função de quão feliz esperamos estar com a escolha daquela marca e a nossa vontade de perseguir a felicidade.

A marca como chave para a felicidade

Uma promessa de marca sobre felicidade é um convite para você acessar memórias e prazeres do passado ou fantasiar sobre sensações mentais futuras.

Marcas existem para fazer as pessoas sonharem e se sentirem felizes. Você não precisa experimentar, só imaginar já pode fazer você feliz. É um processo científico.

Se as estratégias citadas anteriormente para os dois sistemas forem ineficientes, o caminho é tornar a marca chave para a felicidade.

Existem 3 necessidades universais ou motivações intrínsecas que ajudam as pessoas a serem mais felizes: autonomia, competência/aprendizado e familiaridade.

As marcas devem ajudar a destravar a felicidade para consumidores, os ajudando a completar uma ou mais dessas necessidades

O cérebro alcança a felicidade e depois ela decai rapidamente para o estado normal. Por isso, vivemos uma busca eterna. As marcas podem ser parceiras dessa busca.

O “Brand Resolve” acontece porque os consumidores acreditam que a compra de uma marca os fará mais feliz. A marca é vista como chave para ajudar os consumidores na busca pelas três necessidades universais citadas.


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